Na segunda-feira, 24 de março de 2025, a SIS, com apoio do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), realizou a 3ª oficina sobre a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB). O evento online teve como tema “Mineração: Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas”. A gravação pode ser vista aqui.
A Diretora Executiva e Técnica da SIS, Luciane Moessa, mediou o debate e destacou que as propostas da SIS buscam esverdear o setor de mineração, focando na mitigação de riscos sociais, ambientais e climáticos. Ela ressaltou que, embora a mineração seja essencial para diversas cadeias produtivas e muitas vezes os minerais não tenham substitutos viáveis, seus impactos negativos podem (e devem) ser minimizados.
Cristina Reis, subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda, abriu o evento. Uma das idealizadoras das oficinas sobre a TSB, ela enfatizou que essas discussões são fundamentais para qualificar o debate enquanto o documento está em consulta pública. A primeira versão da TSB prioriza atividades com objetivos ambientais, climáticos e sociais, e as contribuições recebidas serão analisadas para ajustes antes do lançamento previsto para agosto, após aprovação do Sistema de Monitoramento, Relato e Verificação (MRV). Reis reforçou a importância das audiências e oficinas para que os setores interessados possam contribuir criticamente.
O primeiro debatedor, Julio Grillo, vice-presidente do Fórum Permanente do São Francisco, observou que a mineração não foi incluída na maioria das taxonomias existentes, exceto na chinesa e na indonésia, esta última ainda sem tradução para o inglês. Ele criticou a inclusão da mineração de alumínio e ferro na TSB, argumentando que esses setores já são altamente explorados e não precisam de estímulos econômicos para acesso ao capital. Grillo apontou que o setor de mineração está vulnerável a eventos climáticos extremos, cada vez mais comuns no Brasil, e relembrou episódios recentes, como os registrados em Petrópolis, Bertioga, Santa Cruz Cabrália e no Rio Grande do Sul, onde chuvas intensas, superiores a 400 mm, causaram grandes impactos, sendo que as barragens de mineração atualmente existentes não foram projetadas para volume de chuvas nesse patamar. Diante desse cenário, a SIS propõe a inclusão de alguns itens na Taxonomia: descomissionamento de barragens (sobretudo inativas) de rejeitos; intensificação do monitoramento da segurança de barragens e pilhas de rejeitos; definição de altura máxima para essas pilhas; revisão dos sistemas de drenagem de águas pluviais e obras de reforço nas estruturas de destinação de rejeitos; destinação de rejeitos para construção civil e para depósito em cavas exauridas; medidas para evitar a contaminação de águas superficiais e subterrâneas, além de ações de descontaminação; reabilitação de áreas mineradas para novos usos; esverdeamento do transporte e uso de caminhões elétricos ou que usem biocombustíveis; e uso de hidrogênio verde na desoxidação do minério como alternativa ao carvão mineral e vegetal. Veja aqui os slides usados por ele.
Bruno Milanez, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora e coordenador do POEMAS (Núcleo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade), ao analisar o documento da TSB submetido à consulta pública, questionou a inclusão da mineração na Taxonomia, argumentando que o setor já recebe amplo financiamento e incentivos, enquanto outras áreas mais urgentes poderiam ser priorizadas. Para Milanez, classificar a mineração como sustentável pode acabar desviando recursos que poderiam estimular setores mais necessários. Contudo, caso sua inclusão seja mantida, ele defende critérios rigorosos, limitando-se a uma mineração de baixo impacto ambiental. Milanez enfatizou que cumprir a legislação não equivale a ser sustentável e sugeriu a exclusão da menção ao cobre na TSB, além do ferro e do alumínio, devido ao impacto ambiental, destacando inclusive os impactos que a mineração tem no desmatamento (por exemplo, na Amazônia), o que torna ilógico excluir as emissões decorrentes de mudanças no uso do solo. Ele defendeu que, quando o documento se refere a terras indígenas (TIs), deveria incluir as TIs reivindicadas, não apenas as delimitadas e homologadas, conforme consta na redação atual, ou ao menos as que já tenham sua área identificada. Destacou também a necessidade de prever prazos e reserva de recursos para fechamento de minas e estabelecer critérios sociais, como número mínimo de empregos gerados, além de limites de consumo de energia e água, para estimular eficiência.
Claudia Salles, gerente de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), destacou que o instituto conta com 270 empresas associadas, das quais 80 atuam na mineração e as demais na cadeia. Ela defendeu a inclusão da mineração na TSB, destacando que não é apenas a taxonomia chinesa que trata da mineração, mas Canadá, Chile, União Europeia, Austrália e, hoje, o Brasil estão com taxonomias em construção que consideram esse setor. Para Salles, excluir o setor seria um erro, pois ele é essencial para diversas cadeias produtivas. Ela explicou que a TSB não garante estímulos econômicos, mas define critérios para determinar se uma atividade é sustentável. Sublinhou que, diferentemente de outras taxonomias, a TSB integra aspectos climáticos e sociais, como geração de empregos. Além disso, destacou que o documento é dinâmico e poderá ser ampliado no futuro. Salles afirmou que oito bens minerais foram selecionados para constar na Taxonomia devido a sua relevância estratégica e econômica no contexto brasileiro, incluindo lítio, nióbio, grafita, alumínio e ferro — que, ressaltou, são fundamentais para a transição energética, compondo turbinas eólicas e placas solares. Claudia mencionou o inventário de emissões de gases de efeito estufa do setor mineral, lançado pelo IBRAM em maio de 2024, com dados de empresas e referências internacionais, e que ele inclui as emissões decorrentes de mudança no uso do solo. Por fim, ressaltou a diferença entre extração e transformação mineral e argumentou que o descomissionamento de barragens já é regulamentado, não sendo necessário destacá-lo na TSB. Sobre economia circular, destacou esforços e investimentos do setor para reduzir e reaproveitar resíduos, citando documentos que recomenda para leitura:
Minerais Críticos e Estratégicos
Inventário de Emissões GEE 2024
Publicações do IBRAM
Economia Circular na Mineração
A última debatedora, Gabriela Sarmet, do Observatório da Mineração, enfatizou a necessidade de uma análise geopolítica internacional sobre a mineração, destacando o papel do Brasil na liderança desse debate. Com a aproximação da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2025, que ocorrerá em Belém do Pará, ela defendeu que é tempo para que o Brasil se comprometa com medidas mais rigorosas do que as previstas hoje na TSB. Para Sarmet, também é importante sempre ter como fundamento que as soluções para a adaptação climática não devem comprometer os esforços de resiliência de comunidades. Ela ressaltou a importância do respeito irrestrito à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI), conforme a Convenção 169 da OIT, apontando que sua violação é recorrente em diversos países, e que, exatamente por isso, é de extrema importância que o Brasil priorize o seu cumprimento. Defendeu também a definição de cronogramas detalhados e públicos para o descomissionamento de barragens e o fortalecimento de medidas de segurança dessas estruturas, especialmente considerando os desastres de Mariana e Brumadinho. Sarmet questionou os critérios utilizados para definir ecossistemas insubstituíveis. Além disso, propôs a substituição do termo “reabilitação ambiental” por “recuperação ambiental”, que engloba tanto reabilitação quanto restauração. Por fim, enfatizou a responsabilidade do setor mineral em toda a cadeia produtiva, reforçando a importância da circularidade, com foco no reuso e na reciclagem — chamando a atenção para o fato de que o Brasil é líder na reciclagem de alumínio. Recomendou a leitura dos seguintes documentos:
Mineração de carvão e termelétricas e sua responsabilidade no desastre do RS
Safety First: Gerenciamento Seguro de Rejeitos
Relatório da ONU sobre minerais críticos para a transição energética
Em seguida, abriu-se espaço para comentários finais. Os participantes destacaram que a TSB busca, sim, direcionar o acesso a capitais. Paulino Marinho, do Ministério de Minas e Energia, reforçou a importância da participação cidadã na elaboração da TSB, enfatizando que há temas no setor de mineração em que a regulamentação também precisa ser ajustada. Destacou que a CLPI já está contemplada nas salvaguardas da TSB e que seu cumprimento deve ser assegurado. Ele defendeu a inclusão de minerais estratégicos na taxonomia, desde que atendam a critérios de elegibilidade, como limites de emissões e alinhamento com medidas de transição energética. Cristina Reis reiterou a necessidade de um caderno específico sobre mineração dentro da TSB, ressaltando sua importância para a economia brasileira e cadeias produtivas sustentáveis e reforçou o convite para que especialistas e entidades do setor contribuírem até o dia 31 de março. Luciane Moessa concluiu lembrando que não há motivo para o setor produtivo se opor às propostas de mitigação de riscos que foram apresentadas, pois todos se beneficiam da prevenção de novas tragédias no setor.