Aconteceu na última segunda-feira, dia 11 de março, o 13º Bate-papo Inclusivo e Sustentável da SIS, evento que marcou o lançamento do estudo “Recomendações para fortalecimento da consideração de questões climáticas e socioambientais nas regulações de seguros e previdência brasileiras”. Este é o último de uma série de três estudos publicados pela SIS que fizeram recomendações aos reguladores financeiros nacionais (o primeiro, dirigido ao Banco Central, e o segundo dirigido à Comissão de Valores Mobiliários).
O estudo foi apresentado por Luciane Moessa, Diretora Executiva e Técnica da SIS e autora do estudo: Participaram como debatedores Danielle Carreira, Diretora de Engajamento com o setor financeiro do World Economic Forum, Natalie Unterstell, Presidente do Instituto Talanoa e Vinícius Brandi, Subsecretário de Reformas Microeconômicas do Ministério da Fazenda. O evento contou com a participação de representantes de reguladores (como a PREVIC) e de associações dos setores de seguros e previdência complementara, da Caixa Econômica Federal, de ONGs (como o iCS, a IMAZON e a Forest & Finance), do Poder Legislativo federal, de profissionais da área jurídica, consultorias (como grupo Report), entre outros.
Para ver os slides utilizados por Luciane, clique aqui.
A metodologia do estudo desenvolvido pela SIS envolveu a análise de regulações e diretrizes já existentes no Brasil e no mundo sobre regulação ASG para seguros e previdência complementar, recomendações de redes globais de reguladores de seguros e de previdência, estudos acadêmicos, estudo de 2021 da PREVIC sobre o estágio do setor regulado nessa matéria e os resultados do Ranking da Atuação Socioambiental de instituições financeiras (RASA). O RASA é uma iniciativa da SIS que, na segunda metade de 2023, avaliou seguradoras e, em seguida, entidades de previdência abertas e fechadas em relação às suas políticas e práticas socioambientais e climáticas. O desempenho claramente insuficiente apurado pelo ranking é mais um indicativo da urgência e importância de uma maior integração de questões socioambientais e climáticas nas normas que regulam os setores de seguros e previdenciário. Luciane explicou que foram analisadas regulações de 9 outros países, mais a União Europeia, que, além do Brasil, possuem normas sobre gestão de riscos ASG para o setor de seguros; já para previdência complementar, em 14 outros países e na União Europeia há normas sobre gestão de riscos ASG.
As recomendações sobre gestão de riscos (e também de oportunidades de impacto positivo) nos investimentos foram realizadas de forma unificada para seguros e previdência, abrangendo:
- definição mais precisa de temas climáticos, sociais, ambientais e de governança relevantes (os climáticos já estão bem definidos na regulação da SUSEP, mas não na da PREVIC);
- maior clareza sobre como deve se dar a identificação de riscos socioambientais e climáticos, diferenciando entre aspectos relativos ao cumprimento legal e aspectos relativos a desempenho/eficiência climática e socioambiental; exigindo que sempre seja considerado o local das operações; abordagem de cadeia de valor, sempre que relevante; previsão de fontes de informação e diligências mínimas; para redução de custos de transação e maior agilidade no fluxo de informações, ela sugere a criação de uma plataforma compartilhada com dados climáticos e socioambientais das empresas receptoras de investimentos, a exemplo do que ocorre com o Bureau de Crédito Verde, do Banco Central, com as operações de crédito rural;
- exigência de elaboração de Políticas de Sustentabilidade (já existe na regulação da SUSEP, mas não da PREVIC), com a participação de stakeholders (não apenas na revisão, como prevê a norma da SUSEP) e outras medidas de governança (Planos de Ação, definição de papeis, dimensão e capacitação da equipe, orçamento compatível para o setor ASG, auditoria interna para verificar cumprimento da Política, integração de fatores ASG na remuneração da direção superior);
- definição das classes de ativos a serem avaliadas, como imóveis e quaisquer investimentos em empresas que operam em setores de risco (sujeitos a licenciamento ambiental);
- seleção e acompanhamento dos prestadores de serviços (asset managers, procuradores, etc)com base em critérios ASG, bem como; integração de fatores ASG nos esquemas de remuneração;
- critérios ASG devem se refletir na seleção de ativos e nas condições dos investimentos (exemplo: taxas de juros e prazos em títulos de renda fixa);
- instituições devem divulgar critérios para o monitoramento dos riscos socioambientais, climáticos e de governança (frequência, periodicidade, abrangência temática, profundidade, consequências);
- medidas de mitigação de riscos ASG: instituições devem publicar suas políticas de voto e engajamento com empresas investidas nessa matéria;
- medidas para gestão de riscos socioambientais e climáticos em nível de carteira de investimentos, incluindo definição de metas, testes de estresse e análise de cenários;
- conteúdo mínimo das Políticas de Sustentabilidade (definição de temas relevantes, formas de identificação, mitigação, monitoramento e avaliação dos riscos; critérios para classificação de risco, para definição de metas, critérios ASG para oferta de produtos financeiros);
- efeito vinculante de compromissos voluntários em matéria ASG.
Já as recomendações específicas para o setor de seguros incluem:
- definição clara do universo de operações de seguros a ser avaliado em termos de riscos e oportunidades socioambientais e climáticas (exemplos: seguro agrícola, seguro imobiliário, etc);
- deve haver consequências da avaliação de riscos dessa natureza no que toca à abrangência da cobertura de sinistros e precificação dos seguros (valor do prêmio);
- medidas de mitigação de riscos ASG: engajamento com clientes segurados;
- seguros para atividades econômicas com impactos socioambientais ou climáticos positivos (viveiros de mudas florestais /restauração de ativos naturais que garantem mitigação e adaptação às mudanças climáticas);
- consideração das preferências ASG dos consumidores no desenvolvimento de produtos de seguros;
- consideração das necessidades dos consumidores relacionadas a riscos climáticos na implementação de produtos de seguros.
O estudo também inclui recomendações para divulgação de informações sobre a composição das carteiras de investimentos e sobre vários dos temas acima mencionados, tanto para seguradoras quanto para entidades de previdência.
A primeira debatedora foi Danielle Carreira, que coordena uma iniciativa global de investidores focados em riscos de desmatamento nas suas carteiras de investimentos (IPDD – Investors Policy Deforestation Dialogue), abrangendo 80 investidores de 21 países, com ativos de 10,3 trilhões de dólares. Ela observou que é preciso que o setor financeiro e o corporativo tracem juntos soluções para combater a crise climática e a crise da natureza, com participação da sociedade civil e destacou a importância da harmonização das normas de todos os reguladores financeiros nessa matéria. Ela também chamou a atenção para a necessidade de que decisões sejam tomadas com base em dados ASG completos e atualizados, com destaque para aquelas referentes à cadeia de valor, pois em alguns setores econômicos os impactos relevantes vêm da cadeia (por isso é lamentável, segundo ela, que a nova norma da SEC dos EUA sobre divulgação de riscos climáticos tenha excluído as emissões GEE do escopo 3). No Brasil, o foco do IPDD é a implementação do Código Florestal e medidas que viabilizem a rastreabilidade do desmatamento. Além de focar nos riscos de destamento via IPDD, outras iniciativas lideradas por ela no World Economic Forum, em parceria com UNEP-FI e TNC, buscam oportunidades de investimento com impacto positivo: o IFACC conta com 15 investidores signatários, que já realizaram 4,6 bilhões de dólares em investimentos, por exemplo, na recuperação de pastagens degradadas e na bioeconomia, na Amazônia e no Chaco, por meio de 11 produtos financeiros que já foram desenvolvidos. Danielle também lembrou que o apetite de investidores institucionais brasileiros na agenda ASG precisa ser incentivado. Considerando que o maior volume de investimentos se concentra em títulos públicos, por que o Brasil não emite títulos públicos vinculados a objetivos ASG voltados para o mercado interno, assim como fez recentemente para o mercado externo? – indaga ela.
Vinicius Brandi, que trabalha na área de regulação financeira do Ministério da Fazenda, elogiou a abrangência do estudo na análise de experiências internacionais e destacou que já existe uma consciência clara de que o risco climático deve ser tratado pelo mercado financeiro, pois este risco afeta instituições tanto em suas operações ativas (crédito) quanto passivas, com especial destaque para o mercado de seguros (o qual tem o importante papel, entre outros, de oferecer cobertura para riscos associados a eventos climáticos). Vinicius explicou que o Ministério da Fazenda está focado, por exemplo, em sustentabilidade nos investimentos e em inovação em produtos financeiros, mas está também atento à necessidade de alinhamento entre os padrões regulatórios, como no caso da regulação bancária (sobretudo no crédito rural), que está muito à frente da regulação de instrumentos financeiros do mercado de capitais, de seguros e de previdência, no que diz respeito a riscos climáticos e socioambientais, ocasionando o fenômeno da “arbitragem”, pelo qual empreendimentos com riscos dessa natureza acabam comparando as regras que mais lhes favorecem e migrando do crédito bancário para o mercado de capitais, em que produtos financeiros ainda não precisam gerir riscos ASG
Natalie Unterstell, Presidente do Instituto Talanoa, lembrou que está em formulação o Plano Clima (estratégia governamental para lidar com as mudanças climáticas), que irá abranger 15 setores econômicos na porção de adaptação às mudanças climáticas e 8 setores no que se refere a estratégias de mitigação. O governo federal pretende, até junho deste ano, desenvolver estratégias gerais e por setores econômicos que vão fornecer dados sobre trajetória de emissões e cenários climáticos sobre riscos físicos e de transição, que deveriam ser considerados em todas as políticas públicas. Entretanto, o PAC, que não investe em adaptação às mudanças climáticas e não inclui estratégias de mitigação do risco climático, está completamente desalinhado com relação ao Plano Clima.
Como uma base de dados que traz dados objetivos sobre o aumento na frequência e intensidade dos riscos climáticos, Natalie citou Monitor de Desastres Climáticos do “Política por Inteiro”, iniciativa do Instituto Talanoa que reúne informações sobre este tipo de desastres.
Assista a gravação do evento em nosso canal no Youtube.
Veja a repercussão do evento na imprensa:
Editora Roncarati – Estudo traz recomendações para que a regulação de seguradoras e entidades de previdência considere preferências de consumidores e aplique critérios ASG em seus investimentos
Revista Cobertura – Estudo traz recomendações para que a regulação de seguradoras e entidades de previdência considere preferências de consumidores e aplique critérios ASG em seus investimentos